É preciso extravasar a energia caótica e destrutiva que habita o
espaço vazio dentro do peito. Saciar esse buraco negro que me consome de dentro
para fora. Ilusão nossa de cada dia, quando sonhamos que estamos voando, mas na
verdade estamos caindo. Constante temporal, rotina, hábitos, nossas próprias
correntes fantasiadas de laços fraternos. Pagando por cada centímetro cúbico de
oxigênio consumido, pagando por cada masso de veneno a ser tragado,
asfixiando-se gratuitamente com a fumaça expelida pelos automotivos. A exaustão
no fim do dia, não tenho ideia de como consegui cumprir os prazos, pagar as
contas, agradar a todos e sobreviver. Contando as horas de sono, ajustando o
despertador, finalmente no conforto de sua cama quente e limpa, nem aqui posso
chorar, nem agora posso morrer, nem amanhã será diferente, só agora posso
viver. Sentir e viver o tempo por que? Porque é o que eu deveria fazer, deixar
algumas palavras no passado, tentar não levar isso para o futuro, lutar para
sobreviver à elas no presente. Perder o medo de estar sozinha, perder o medo de
olhar para dentro de si mesma, encontrar o medo e reagir instintivamente.
Provar o gosto do seu próprio sangue, fluído fascinante que te sustenta.
Um dia eu acordei e todos haviam sumido, tomei meu café da manhã,
peguei minha jaqueta, meus cigarros e meu carro e dirigi para o centro da
cidade. Passei num posto de gasolina e fui em direção a prefeitura, acendi meu
cigarro no fogo do coquetel molotov e lancei em direção aos vidros. Um após o
outro até ver tudo em chamas, do outro lado da rua eu sentei no meio fio e
fiquei observando o magnífico elemento da natureza fazendo seu trabalho. Depois
disso eu só dirigi por aí, sem rumo, sem esperanças de encontrar mais alguém,
sem nada em mente, só uma paz que me preenchia inteira.